O FEITICEIRO FAJUTO DA QUARTA DE CINZAS
Adaptação de Marcus Villa Góis da tradução de Roberta Barni do original de Flaminio Scala em Il teatro delle favole rappresentative... Ed. Iluminuras, São Paulo, 2003. 1ª Ed.: Pulciani, Veneza, 1611.
Personagens
Pantaleão – ator 1.
Isabela – filha – Poliana
Hortência – criada – ator 5.
Graciano – doutor - ator 4.
Flamínia – filha – ator 2.
Flávio – filho – ator 7.
Arlequim – criado – ator 3.
Francisquinha – criada – ator 2.
Horácio – sozinho e nobre – ator 6.
Médico - ator 6.
Coisas: Dois trajes de espírito; quatro copos com vinho; uma rosca; roupa de feiticeiro; roupa de Padilha, com o tridente, para Francisquinha. Candeia; remédio; serpentinas de carnaval;
Argumento
Moravam numa grande cidade dois grandes mercadores, o primeiro chamava-se Pantaleão, que tinha uma só filha, Isabela. E o segundo chamava-se Graciano, que tinha dois filhos, um de nome Flávio e a outra chamada Flamínia. Deu-se que, um jovem chamado Horácio dotado de nobreza, virtudes e bens encantou-se por Flamínia. Flávio, por sua vez, revelou o seu amor por Isabela, filha de Pantaleão, tão amigo de seu pai. Assim perseverando, com tempo e com conforto, com a ajuda dos criados, ambos os jovens desfrutaram de suas amadas, e para enorme contento engravidaram as mulheres.
Carnaval
CENA 1: PANTALEÃO e HORTÊNCIA
Pantaleão aflige-se com Hortência, sua criada, pela enfermidade de Isabela, sua filha, e por sua barriga estar ficando tão avolumada. Hortência culpa muitas coisas na ilha onde passaram o verão com toda a família, e que seria bom lhe dar um marido, propondo-lhe Flávio. Pantaleão, encolerizado, diz que prefere antes afogá-la; nisto
CENA 2: HORÁCIO, PANTALEÃO e HORTÊNCIA
Horácio endemoninhado, vai discorrendo consigo próprio e à roda de Pantaleão, dizendo: “Sua filha morrerá” e fazendo atos de possuídos, para amedrontá-los; vai-se embora. Pantaleão manda Hortência buscar o médico, e esta vai-se. Pantaleão, sai.
CENA 3: FLÁVIO e ARLEQUIM
Flávio aflige-se com Arlequim pela desconfiança de Pantaleão. Arlequim conta que Horácio mandou que dissesse a Pantaleão que estava possuído, mas que não sabe com que finalidade; nisto
CENA 4: HORTÊNCIA, FLÁVIO e ARLEQUIM
Hortência diz a Flávio que o médico quer ver a urina de Isabela. Ele suspeita que o médico descubra a gravidez. Flávio diz que gostaria de falar com Isabela. Hortência diz que dará um jeito em tudo e entra para fazê-la urinar. Eles ficam; nisto
CENA 5: ISABELA, FLÁVIO e ARLEQUIM
Isabela pede a proteção de Flávio, estando a gravidez no auge; fazem cena amorosa; Isabela entra em casa; nisto
CENA 6: FLAMÍNIA, FLÁVIO e ARLEQUIM
Flamínia à janela, pede a proteção de Flávio seu irmão, dizendo-lhe como a sua gravidez está ficando cada vez mais perceptível; nisto
CENA 7: GRACIANO, FLAMÍNIA, FLÁVIO e ARLEQUIM
Graciano de dentro, chama a filha, perguntando com quem ela está conversando. Flávio vai embora. Flamínia fica com Arlequim, e, vendo o pai chegar, prontamente desata a cantar, e Arlequim a dançar; nisto
CENA 8: GRACIANO, FLAMÍNIA e ARLEQUIM
Graciano vendo Flamínia dançando e cantando crê que tenha enlouquecido; com belas palavras, manda-a para dentro, depois manda chamar Francisquinha.
CENA 9: FRANCISQUINHA, GRACIANO e ARLEQUIM
Francisquinha em cena, Graciano vai levá-la consigo à Ribanceira para comprar vinho, mandando Arlequim lavar o tonel (para a festa de carnaval no dia seguinte), saem. Arlequim reclama e sai.
CENA 10: HORÁCIO e FLÁVIO
Horácio diz a Flávio que fingiu estar possuído para Pantaleão e tudo o que lhe disse. Flávio conta-lhe que Hortência inventou um modo através do qual eles poderão entrar nas casas de suas mulheres; e que é preciso avisá-las, agora que está anoitecendo; nisto
Noite
CENA 11: FLAMÍNIA, FLÁVIO e HORÁCIO
Flamínia à janela, faz cena amorosa com Horácio; nisto
CENA 12: ISABELA, FLAMÍNIA, FLÁVIO e HORÁCIO
Isabela, à janela, diz a Flávio que as dores da gravidez estão atormentando-a; Flamínia diz o mesmo. Flávio avisa as mulheres que Hortência arrumou um modo para possibilitar o encontro deles e que, seja o que for que elas virem, não devem temer porque tudo será para que possam estar de novo juntos. Mulheres alegres, recolhem-se; eles vão-se.
CENA 13: PANTALEÃO e HORTÊNCIA
Pantaleão com candeia, diz que ficou sabendo que o médico encomendou um remédio para amanhã; entra em casa. Hortência diz que de dia quer ir buscar o remédio, somente para animar a história e Pantaleão, sai.
Dia
CENA 14: GRACIANO e FRANCISQUINHA
Graciano diz que dormiram na casa do irmão, dizendo que mandaram o vinho e uma rosca, e diz que quer provar o vinho; batem na porta.
CENA 15: ARLEQUIM, GRACIANO e FRANCISQUINHA
Arlequim responde, depois fora recebe o patrão, dizendo que o vinho chegou. Graciano dá-lhe dinheiro para comprar meio quilo de queijo para o desjejum e diz que quer experimentar o vinho; entra com Francisquinha. Arlequim fica.
CENA 16: HORTÊNCIA e ARLEQUIM
Hortência com remédio, faz Arlequim acreditar ser um vinho. Arlequim bebe um pouco, fica enjoado, e vai-se. Hortência ri; nisto
CENA 17: PANTALEÃO e HORTÊNCIA
Pantaleão desesperado por sua filha Isabela, vê Hortência com o frasco do remédio, manda-a em casa para dá-lo a Isabela. Ela sai.
CENA 18: MÉDICO e PANTALEÃO
Médico chega; Pantaleão afaga-o, rogando-lhe que cure sua filha; nisto
CENA 19: HORTÊNCIA, MÉDICO e PANTALEÃO
Hortência em cena; Pantaleão ordena-lhe que leve o médico até Isabela, para que possa examinar melhor a sua doença, e sai. Médico manda chamar Isabela; Hortência entra em casa, depois volta com Isabela.
CENA 20: ISABELA, HORTÊNCIA, GRACIANO e MÉDICO
Isabela é examinada pelo médico; Graciano apartado ouve tudo. Por fim Isabela confessa estar grávida de Flávio; Médico consola-a, manda-a para casa. Isabela sai com Hortência para um lado, o médico para o outro.
CENA 21: GRACIANO
Graciano diz que Flávio seu filho é um reles, e que por isso é que ele andava tão estranho; nisto
CENA 22: FLÁVIO e GRACIANO
Flávio chega; Graciano vai gracejando com Flávio sobre o amor e sobre o engravidar das mulheres. Flávio imediatamente finge um mau súbito, sai. Graciano fica.
CENA 23: PANTALEÃO e GRACIANO
Pantaleão chega. Graciano diz que compreendeu qual é a doença de Isabela e, para saná-la, pede-a em casamento por Flávio, seu filho. Pantaleão recusa. Graciano diz que se a quer curada, que a dê para Flávio. Pantaleão, encolerizado, sai para ir falar com o médico. Graciano fica.
CENA 24: ARLEQUIM e GRACIANO
Arlequim entra em cena com o queijo, entrega-o a Graciano, vomitando à sua volta por ter bebido o remédio. Graciano diz que entre em casa para experimentar do outro vinho, sai. Arlequim fica, vomitando; nisto
CENA 25: FRANCISQUINHA e ARLEQUIM
Francisquinha chama-o para provar o vinho. Ele vomita, e diz que seu corpo dói. Francisquinha entra; Arlequim se demora.
CENA 26: HORTÊNCIA e ARLEQUIM
Hortência diz que o médico é homem de bem. Arlequim queixa-se dele, enjoado e esforçando-se para por tudo para fora; nisto
CENA 27: GRACIANO, HORTÊNCIA e ARLEQUIM
Graciano, de dentro, chama Arlequim, perguntando-lhe quem está com ele. Ele diz: “Hortência!”. Graciano chama-a, que vá beber e festejar. Hortência entra, Arlequim fica; nisto
CENA 28: GRACIANO e ARLEQUIM
Graciano, comendo, sai para chamar Arlequim; convida-o a comer em casa; Arlequim, vomitando, vai atrás.
CENA 29: PANTALEÃO e MÉDICO
Pantaleão pergunta a opinião do médico sobre a doença de sua filha. Médico diz a Pantaleão que case sua filha com quem ela quiser, e que se não o fizer, em breve tempo terá dor e desonra, e que os homens sábios sabem tomar as próprias decisões, e sai. Pantaleão fica pensativo quanto às palavras sobre a honra; lembra-se do que Graciano lhe disse, ouve cantos e brindes na casa dele; bate.
CENA 30: GRACIANO, HORTÊNCIA, FRANCISQUINHA e PANTALEÃO
Comendo e bebendo e bêbados como gambás. Pantaleão repreende Graciano, que cai no chão bêbado, depois de muitos atos ébrios; e assim, um depois dos outros, todos caem no chão. Pantaleão espanta-se; nisto
CENA 31: ARLEQUIM, GRACIANO, HORTÊNCIA, FRANCISQUINHA e PANTALEÃO
Arlequim leva-os todos, um a um, dentro de casa, em vários modos ridículos; por fim volta, quer pegar Pantaleão, que foge pela rua. Arlequim entra casa.
CENA 32: FLÁVIO E HORÁCIO
Flávio diz a Horácio estar desconfiado de que o pai saiba alguma coisa sobre o seu amor, devido às palavras que lhe disse antes; nisto
CENA 33: HORTÊNCIA, FLÁVIO e HORÁCIO
Hortência meia entorpecida pela bebedeira; os amantes afligem-se com ela, porque ela está esticando demais o assunto. Hortência que deixem com ela e chama Arlequim;
CENA 34: ARLEQUIM, HORTÊNCIA, FLÁVIO e HORÁCIO
Arlequim surge. Hortência manda Arlequim ir nas casas avisar às mulheres que logo estarão contentes; Arlequim sai. Hortência manda-os se disfarçarem de espíritos, com aquele amigo deles que faz máscaras e fantasias. Eles saem, Hortência fica.
CENA 35: PANTALEÃO e HORTÊNCIA
Pantaleão ralha com Hortência porque fica se embebedando em vez de cuidar da casa. Hortência culpa Graciano, depois lhe diz que encontrou um sujeito que irá curar a sua filha; nisto
CENA 36: GRACIANO, PANTALEÃO e HORTÊNCIA
Graciano chega, Pantaleão repreende-o. Graciano desculpa-se, dizendo que é Carnaval. Hortência diz mais uma vez que encontrou um sujeito (um feiticeiro) que irá curar as duas filhas deles. Graciano pede pela sua, mas pela de Pantaleão desata a rir, dizendo que ela nunca vai sarar, se não conseguir se casar com Flávio, seu filho. Hortência manda que a esperem atrás do cemitério, e que não digam nada sobre o feiticeiro, pois ele não quer ficar conhecido. Eles saem, Hortência fica em cena.
CENA 37: ARLEQUIM e HORTÊNCIA
Arlequim chega; Hortência diz que quer tirar do aperto as suas patroas e burlar dos velhos. Manda-o se disfarçar de feiticeiro, e que, na volta, lhe dirá o que tem de fazer, avisando que, quando estiver diante de Pantaleão, deve fingir que está esconjurando os espíritos. Arlequim sai. Hortência bate para avisar as namoradas.
CENA 38: ISABELA, FLAMÍNIA e HORTÊNCIA
Flamínia à janela e Isabela à janela. Hortência avisa as namoradas que não tenham medo do que verão, porque tudo será encenação, e que depois fará elas sentirem doçura; namoradas, alegres, retiram-se. Hortência vai encontrar os amantes, sai.
CENA 39: ARLEQUIM
Arlequim, carregando a roupa de Padilha e o tridente, diz que pensou numa esperteza em dobro; chama Francisquinha.
CENA 40: FRANCISQUINHA e ARLEQUIM
Francisquinha entra em cena, recebe as coisas, e a ordem em seu ouvido, apontando o pórtico no alto da casa. Ela entra, ele vai se disfarçar, sai.
Noite
CENA 41: PANTALEÃO e GRACIANO
Pantaleão diz a Graciano que quer arrumar marido para a filha, assim que ela tiver sarado, negando-se a dá-la para Flávio que é um rebelde; mas diz que, se Graciano quiser lhe dar Flamínia em casamento, quando estiver curada, ele então concordará em dar Isabela para Flávio, seu filho. Graciano concorda; nisto
CENA 42: HORTÊNCIA, PANTALEÃO e GRACIANO
Hortência completamente esbaforida, diz ter perdido de vista o feiticeiro; nisto
CENA 43: ARLEQUIM, HORTÊNCIA, PANTALEÃO e GRACIANO
Arlequim vestido de feiticeiro, esconjurando os espíritos, fala com os velhos, formando dois círculos, um de um lado da cena e o outro do outro lado, dentro dos quais manda entrar Pantaleão e Graciano, ordenando que eles, por mais que vejam e ouçam, não se mexam; nisto Arlequim esconjura, chama os espíritos.
CENA 44: FLÁVIO, HORÁCIO, ARLEQUIM, HORTÊNCIA, PANTALEÃO e GRACIANO
Flávio e Horácio vestidos de espírito, girando em volta dos círculos, assustando os velhos e Hortência. Depois cada um deles entra na casa da própria mulher. Os velhos se espantam, com gestos. Arlequim, olhando o céu, chama Padilha, a Rainha das Pombas-Giras, que venha acima da casa.
CENA 45: FRANCISQUINHA, ARLEQUIM, HORTÊNCIA, PANTALEÃO e GRACIANO
Francisquinha vestida como Padilha; Feiticeiro pergunta-lhe a vontade dos deuses quanto a casar as filhas dos velhos. Francisquinha diz que os deuses querem que Isabela seja de Flávio e Flamínia de Horácio, e que, os pais não concordando, aqueles espíritos que apareceram terão de levá-los aos infernos. Velhos concordam; Francisquinha sai; nisto e imediatamente
CENA 46: ISABELA, ARLEQUIM, HORTÊNCIA, PANTALEÃO e GRACIANO
Isabela sai dizendo: “Senhor meu pai, eu estou curada, e não quero outro marido se não aquele que está em casa”. Nisto e imediatamente
CENA 47: FLAMÍNIA, ISABELA, ARLEQUIM, HORTÊNCIA, PANTALEÃO e GRACIANO
Flamínia, de casa, diz o mesmo. Velhos dizem que não querem se aparentar com diabos (e saem dos círculos). Feiticeiro: que quer que eles conheçam o seu valor; esconjura novamente. Os velhos voltam pros círculos
CENA 48: FLÁVIO, FLAMÍNIA, ISABELA, ARLEQUIM, HORTÊNCIA, PANTALEÃO e GRACIANO
Flávio entra em cena em suas feições.
CENA 49: HORÁCIO, FLÁVIO, FLAMÍNIA, ISABELA, ARLEQUIM, HORTÊNCIA, PANTALEÃO e GRACIANO
Horácio o mesmo. Arlequim os faz casar com as jovens, e eles querem premiá-lo. Arlequim diz não querer outro prêmio, senão Francisquinha; de acordo, chamam-na. Flamínia sai para buscar Francisquinha.
CENA 50: FRANCISQUINHA, HORÁCIO, FLÁVIO, ISABELA, ARLEQUIM, HORTÊNCIA, PANTALEÃO e GRACIANO
Francisquinha banca a temerosa, depois concorda. Arlequim manda perdoar algumas espertezas a uma certa Hortência. Velhos concordam; ele finge esconjurar, depois arranca a barba postiça do rosto, revela-se; nisto
CENA 51: HORTÊNCIA, FRANCISQUINHA, HORÁCIO, FLÁVIO, FLAMÍNIA, ISABELA, ARLEQUIM, PANTALEÃO e GRACIANO
Hortência confessa todas as espertezas que aprontou para contentar os jovens amantes e para salvaguardar a honra de suas casas; todos louvam-na.
E aqui termina a comédia.
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